Esparsos e parcos apontamentos

quinta-feira, novembro 11, 2004

Zénite

Para S.

Num piscar de olhos, o Sol deixa de subir e começa a descer, assim mesmo, de repente, sem avisos ou contemplações, dúvidas ou hesitações, e nesse segundo apenas tudo muda, as sombras, a temperatura, as pessoas, a manhã passa a tarde, o bom dia a boa tarde, a chegada dá lugar à partida, o cumprimento esvai-se em despedida.

Vejo a minha sombra alongar-se e pergunto-me onde irá parar, até onde chegará até que o Sol desapareça de vez e deixe como ténues substitutas as estrelas.

Se estivesse na pampa sul-americana, num deserto africano ou na tundra siberiana, fixaria um ponto no horizonte e, de costas voltadas ao Sol, esperaria pacientemente que a minha sombra lá chegasse, quieto, calado, e seguiria a distância a percorrer, sabiamente ditada pelo astro.

Cruzaria os Pirineús, cavalgaria nos Alpes e com os Cárpatos como trampolim, atravessaria os Urais, ao ritmo das sombras, caminhando a distância certa, simplesmente aquela e não mais, todos os dias, pensado que passarei por ti, várias vezes, quantas vezes só o Sol o sabe, até que um dia venhas também ver o mundo em espirais de luz.