Esparsos e parcos apontamentos

quinta-feira, novembro 04, 2004

O Encontro

Em Paris tudo é qualquer coisa e qualquer coisa é fantástica.

Entre aquele céu e as margens do rio, com as suas inúmeras pontes iluminadas, estátuas altivas desafiando quem passa, algo que suceda é ampliado e sentido como se fosse simultaneamente o nosso primeiro e último dia, uma mistura de euforia ao descobrir um novo mundo e o desejo de absorver um pouco de tudo no escasso tempo da despedida.

Ali se dá o reencontro, numa livraria do Quartier Latin. Não há qualquer inibição inicial apesar dos quase dez anos que os separavam, desde aquela noite em Viena. Nem espanto.

Por entre cigarros, ruelas e cafés, vão descobrindo o que fizeram enquanto sonhavam um com o outro assitindo à passagem da vida fluente, imparável e indiferente.



Apanham o barco para esticar o pouco tempo que lhes resta juntos e, depois do Sol iluminar magistralmente a sua beleza, no banco de trás de um carro com motorista, confessam o desespero que é viver, o fracasso do Amor, ao mesmo tempo que o assombro desse encontro se vai aos poucos esvaindo para dar lugar à aceitação da solução que se perfigura, do futuro.

Sobem as escadas em silêncio, seguros e conformados como se de uma sentença se tratasse.

Nesses dez anos, haviam vivido dos 25 aos 35, acumulando amores e falhanços, sentindo crescer o conformismo de quem já não sabe amar, uma década de vazios emocionais em que o calor da sua memória lhes iluminava o caminho, lhes dava força para continuar a tentar, iniciar mais relações em que sabiam de antemão que em nada seriam comparáveis a Viena, uma noite, um Amor.

Retiveram a memória do seu último encontro como o último amor possível, a última oportunidade, o último momento de felicidade verdadeira, desperdiçado e longínquo.

Agora, num loft, com chá e jazz tudo fica diferente.