O caderno
Como tudo o que é importante, a compra de um caderno novo arrastava-se há semanas.
Quase não me restava papel para apontar ideias e não fosse o gastíssimo Livro das Ideias ter reservado algumas páginas livres, tempos mortos entre 1998 e 2003, teria começado a escrever nas próprias mãos.
Mas não se pode retomar o que já foi interrrompido. Depois desse tinha já escrito num Bloco Castelo, reciclado ou simplesmente amarelado pelo correr dos dias, no Âmbar de bolso e num bloco ofertado a quem comprasse um Dostoievski na Feira do Livro.
Mais que simples objectos, estes blocos acompanham-me, fazem quilómetros comigo, carregam milhares de palavras que por vezes se substituem à própria memória.
Isto nunca se pode retomar...
Esperei na livraria habitual por um Moleskin que não chegou para apontar reflexões como Sepúlveda, detalhar viagens como Chatwin, romancear a minha vida como Hemingway mas, em terra firme como estou, optei por um caderno só meu.
"Um bom dia para viajar" (quanto a mim, todos!), viagens no interior de cada um, subir uma avenida de Lisboa pode ser mais marcante que navegar no Pacífico, cruzar os Urais ou cavalgar nos Andes.
30.IX.2004 - 16h21
Picoas Plaza, Lisboa